28 de março de 2009

Âncoras aquém. Para Ramiro Torres

Foto A.B./I.A.
Para Iolanda Aldrei, procuradora.

Esta rosa que nasce entre o ser
E o teu caminho traz a recordação
De todas as mudanças que vêm:
Aqui podes descansar o peso dos
Tecidos aderidos ao corpo, dar-lhe
À transparência o seu lugar nas mãos,
Nos olhos nadando os peixes do vazio.

Tua é esta linha que atravessa o tempo
Rumo às barcas perfumadas de sol,
Incrustada em tuas veias a canção
Da procura, a alimentar toda a luz.

Dezembro de 2008. RAMIRO TORRES


Ancorada na baía, proa a terra,
a nave do velho Alexandre voltou.
O capitão amarrou duas lágrimas,
descarregou no porto cheiro a mar,
reiterou a Terra, terra sua
e foi a casa logo, acompanhado
por compadres de longo navegar.
Urbano Lugris apresentou-lhe
Ismael e o capitão Ahab ,
e confessou ser o autêntico,
o único, o mesmo, Ulyses Fingal
o armador de mundos,
terra adentro,
em tempos revoltados até o azar.
E soubemos do cavaco, do convívio,
muito perto da rua Irreal.
Convocados por marinho de sonhos,
achegamo-nos logo a libar o rum
e escutar os cantos que nasciam
acrónicos entre as pátrias e os cais
e pensar em dias que já foram,
em tardes que vinham de além mar.
À sombra da biblioteca, o tempo,
deitava-se utópico a aboiar,
e o coro cantava em voz de ilha
e revoltavam bússolas no olhar
Branda, Carmen Cierto, Karlom López,
Manuel Silvestre, Manoel Bonabal,
Nacho Baamonde, Omar Kessel,
Nando Lestón, Roberto Castro,
Rubén Fenice, Espiñeira,
Sebas Anxo, o Cerviño e Inma Doval,
deixavam nas memórias uma imagem
de luz colectiva e água-lar
para acolher palavras que desciam
até a ribeira desde um vendaval
e partiam papel e rumo ao norte
na nave de moluscos, alga e sal
desde a Torre em Torres de Ramiro.
Alexandre, o novo, companheiro
de incursões na casa do xará,
era coro dos versos que ancoravam
na pele, na árvore da vida,
na luz original, e mão em mão,
viajante também sobre as cidades,
deixava-se esculpir na transparência
que emergia do verbo,
da pena de Ramiro a desenhar
um mundo próprio e colectivo
no que me sentia uma vez mais,
como a luz serena da noite
em que volvemos, sempre,
ao início do canto da união.

2 comentários:

Ramiro disse...

Muitas graças desde o além e o aquém, caminhos complementares da mesma verdade que nos liberta, eternamente.

Saúde e parabéns por este magnífico blog.

Iolanda Aldrei disse...

Apenas é uma parte daquele sabor que fica guardado na parte da memória que sempre queremos connosco. O teu poema fez que me sentisse levada a um mundo de liberdade, de luz, acompanhada de tanta cor, de desenho, de um coro que ensaiava. Ficou um tempo possível, além do impossível feito dor. Os teus versos ancoravam nos princípios da eternidade e Lugris voltava com Alexandre Bóveda, e tudo era puro como teria sido.
Agora, quando as histórias tristes voltam a esta terra, um novo Alexandre me acompanhava e reiterava as tuas palavras. Por isso agradeço para além do canto os sonhos que acordou.
Saúde, bardo dos tempos e as liberdades.